segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Cap.III . O humano , a Elfa e o buraco.


Por volta do meio-dia, a vegetação já não era tão densa e logo Loren se viu uma vez mais na estrada dos homens. Seguindo por ela em algumas horas estaria novamente em Hal, pequena cidade onde as mais variadas espécies se encontravam, na maioria das vezes para fazer negócios de todos os tipos. Ali deveria procurar pelo centauro Wordz. Enquanto não chegava o pensamento ainda se mantinha em sua família. Perdeu vários dias procurando pistas sobre a rosa azul fora de Alzegrim, inclusive em Hal e agora que ouviu sobre o centauro, precisava visitá-lo.

Pensar sobre sua família a fazia prender-se a questão da imortalidade. Para um elfo, encarar a morte é a maior dor do mundo, já que no geral são imortais, exceto caso sofram ferimento fatal. Fora uma dor imensa para Loren perder sua mãe, seu pai estava distante e não se perdoaria se não conseguisse salvar seu avô.

– Aqui, ajuda!

Com um susto se libertou de seus pensamentos. Os gritos vinham de dentro de um buraco na margem esquerda da estrada. Já com o arco armado se aproximou do que parecia uma armadilha de caçadores e apontou…

– Por favor, não me mate!

Era um humano ou quase. Devia ser jovem. Uma criança para os padrões élficos.

– O que faz aí embaixo criatura? – Disse Loren, mais calma agora. Não tinha visto ou falado com muitos humanos durante sua pequena longa vida, mas eles divertiam-na bastante com seu jeito apressado e incomum de encarar as coisas da vida e seus acontecimentos atribulados.

– Eu… caí aqui dentro sem querer. Minha perna está doendo. Pode me ajudar moça?

– Não sei se devo. Você é um estranho e sempre fui educada para evitar estranhos – Loren quase ria. Pensou melhor e viu que era maldade brincar com alguém naquela situação. Valendo-se do conhecimento de sua raça sobre áreas selvagens, não foi difícil localizar uma árvore onde crescia uma trepadeira parasita, que serviu-lhe de corda para içar o estranho de dentro do buraco.

– Pelos deuses moça, me ajude! Estou aqui por horas, não consigo me mover muito. Tem muitos insetos nesses buracos, sem falar no cheiro e na lama…

– Pela deusa digo eu! – Loren jogava agora a corda improvisada para que o estranho subisse. – Você fala mais que o xamã em noite de ritual! Agarre-se à corda e não solte. Vou tirá-lo daí.

Quando terminou de ser puxado pelo buraco, o rapaz olhou com espanto para a elfa, que parecia não fazer nenhum esforço para sustentar seu peso. Ela o reconheceu mas não poderia dizer nada, já que ele não a tinha visto na floresta dias atrás. Um silêncio estranho pulsou entre eles por algum tempo.

– Para onde você vai? – começou o humano – Não sabe que é perigoso pra uma moça ficar sozinha na estrada dos humanos?

– Corro risco de “cair” em um buraco? A propósito não precisa mesmo agradecer – Virou-se sem mais satisfações e continuou seu caminho.

– Espera, é sério, tem uns bandidos perigosos por ai…

– Acho que não caiu naquele buraco não é?

Nesse momento Markus emudeceu – o centauro o mataria se soubesse que lhe roubaram a espada.

– Preciso procurar uma coisa, obrigado pela ajuda – dizendo isso Markus tomou o sentido oposto a Hal, indo o mais rápido que podia.

Loren ficou com a impressão de que ele provavelmente escondia algo. Resolveu não julga-lo precipitadamente porque estaria agindo como um humano. Seguiu-o silenciosamente até o entardecer e notou que seguia um rastro de cavalo. Uma fumaça típica de acampamento denunciou aonde ia.

Havia três homens grandes de porte bem “forte” sentados em volta de uma fogueira. Logo atrás três cavalos pastavam tranquilamente, sendo os primeiros a notar a presença de Markus.

O jovem humano, de frente para os três homens – que não viam ameaça nele e permaneceram tranqüilos – murmurou algumas palavras e atirou algo ao chão que fez os três grandalhões rirem, mas por pouco tempo. Segundos depois uma raiz brotou da terra e prendeu o da direita ao chão.

– Vim buscar o que tiraram de mim. – falou Markus com a voz firme, duvidando se teria sido realmente uma boa idéia encarar o problema tão de frente.

– Tente pegar – disse o do meio já desembainhando a espada élfica furtada.

Loren conhecia aquela espada. E o vislumbre dela fez com que saísse de seu esconderijo e ficasse entre o homem e o garoto.

– Ora, mas que coisinha mais linda – começou o cavaleiro da esquerda.

– Quer mostrar um pouco da arte élfica minha boneca? – disse o outro homem. As coisas iam esquentar agora.

O primeiro carregava uma maça de guerra e o segundo a arma que levou ao impasse. Pelo jeito como se vestiam dava pra notar que andavam por aí saqueando viajantes incautos. Eles avançaram para a elfa que se irritava ao imaginar o que eles andaram aprontando, dificultando a vida de pessoas como Markus. A espada responsável por aquele “encontro” era uma raridade élfica perdida há séculos. Loren não se perdoaria se não recuperasse parte da história de seu povo que estava bem ali. O jovem humano com certeza devia algumas explicações.

– Vocês querem ver arte élfica? Vocês verão. – com muita habilidade armou o arco com uma de suas preciosas flechas. Os cavaleiros não demonstraram medo e estavam cada vez mais perto quando, sem saber exatamente porque, Markus colocou-se na frente dela, avançou para o lado do cavaleiro que portava a espada e o atingiu com um soco, desequilibrando-o, mas pela surpresa que pela força do golpe. Seu companheiro rapidamente o defendeu, acertando o braço esquerdo de Markus com a pesada maça. Loren estava perplexa, já que não esperava tal atitude de um garoto humano. Markus estava muito machucado pelo golpe e o próximo ataque o mataria, então a elfa disparou sua flecha contra o ladrão, acertando-o em cheio no peito e levando-o ao chão. Não estava morto.

Para sorte do imenso delinqüente, sua veste de malha de aço se mostrou bastante útil impedindo a flecha de lhe fazer mais que um pequeno corte. De qualquer forma aquilo assustou aos três que fugiram deixando a espada e o cheiro de um belo cozido.

Os dois improváveis companheiros decidiram então se apossar do acampamento dos três valentões usufruindo de seus sacos de dormir e até mesmo de sua comida. Passaram alguns minutos comendo sem muitas palavras. De certa forma Markus tinha algum receio de iniciar uma conversa com a elfa que lhe pareceu tão assustadoramente valente.

– Onde conseguiu essa espada? – perguntou por fim Loren quebrando o silêncio.

– É uma encomenda. Apenas fui buscá-la onde me indicaram que estaria. Ela é muito bonita não acha?

– Quem lhe mandou ? – perguntou ignorando o comentário do garoto.

– Eu não posso dizer, não sei se ele gostaria que eu – antes da frase sair por completo Loren já apontava a mesma espada em direção ao pescoço de Markus.

– Eu acho que ele não se importaria.

– Por favor, foi Wordz, o centauro. Todos têm medo dele.

– Têm é? – respondeu Loren seca – Meus parabéns garoto, acaba de ganhar escolta até Hal.

Aproveitaram o resto do dia para fazer a pouca distância que os separavam da cidade dos humanos e foram em silêncio. Loren pensava sobre o que o garoto lhe dissera e sobre seu indefinido companheiro de viagem de quem ainda não sabia o nome e que era, ora corajoso como um elfo, ora covarde e indeciso como um ladino. Markus imaginava se essa moça de aparência tão doce e frágil seria a mesma que o puxara do buraco tão facilmente e encarava os ladrões da estrada com mais coragem que muitos dos soldados beberrões de Hal.

Nesse ritmo, chegaram na cidade sem se falar e o silêncio entre eles foi quebrado apenas quando a elfa exigiu que ele a levasse até o centauro. Depois de atravessar quase toda a cidade, avistaram a ferraria e na porta dela, a figura imponente de Wordz.

Um comentário:

Anônimo disse...

Loren se parece comigo... lendo sua história é como se a personagem tivesse mais de mim do que eu mesma.
Está emocionante Bê.
Ah você sabe que tem o dom né?
tá ótima.